Diário
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Textos finalmente reunidos
05 ABRIL 2022
Este mês mudei finalmente a plataforma em que escrevia a newsletter mensal da Mariamélia desde há quase praticamente 5 anos. Queria uma plataforma de gestão mais simples e mais indicada para o tipo de emails que escrevo: formato de long-read, com poucas imagens e muito texto, ao invés das newsletters mais baseadas em promoção de produtos que é mais comum as marcas desenvolverem. Essa parte, da divulgação dos produtos, deixo-a nas redes sociais (ver links abaixo). Na newsletter quero um espaço de pensamento e debate.
No Substack podem subscrever para receberem os emails na vossa caixa de correio, mas também podem ter facilmente acesso aos textos online, num formato tipo blog, que procurava à muito, para poder reunir todos os textos que tenho escrito nos últimos anos. É útil para mim, e para os novos leitores/as. Tenho muito tendência para me repetir — porque ando tantas vezes à volta com os mesmos assuntos — pelo que vê-los todos reunidos e organizados (e ilustrados), deixa-me espaço para voltar a alguns temas com visões novas, e desenvolver outros temas ainda por explorar.
Todo este trabalho continua a ser feito gratuitamente, e assim continuará. Se quiserem contribuir para o meu esforço de reflexão e escrita, podem-me pagar “um café”, que no meu caso, são livros, através da simpática plataforma buy me a cofee — uma ferramenta para os freelancers e criativos digitais, em que podemos pagar um “café” a alguém que faz um trabalho de partilha de conteúdos públicos, mas que quer continuar a disponibilizar esse trabalho a todes, sem paywalls. O contributo mínimo são 5€ e o máximo 25€.
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FILOSOFIA
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16 outubro 2021
& URBAN TREES IN PORTUGAL
Floresta nativa, regeneração e árvores urbanas
REGENERATION OF THE NATIVE FOREST& URBAN TREES IN PORTUGAL
A propósito de uma conversa informal que escutei do Nuno Gomes Lopes, o primeiro convidado da primeira loja pop-up da Mariamélia (em 2018), sobre o tema da floresta nacional e da questão, muito presente nessa altura, dos incêndios e do papel dos eucaliptos — quis voltar ao tema do ambiente e muito particularmente das árvores e da floresta portuguesa. Não baseando-me em estatísticas ou notícia — esse é um trabalho de investigação que cabe aos especialistas mas trazendo a opinião de alguém que conhece o território, as espécies nativas (e as outras), e que me poderia iluminar na procura de uma ideia de verdade sobre o ambiente em Portugal: é tudo mau? Ou, por outro lado, temos motivos para ter esperança numa floresta regenerada, depois de anos de incêndios devastadores?
De novo a floresta
Notícias boas
Filipa:
No fundo, [queria fazer] uma espécie de revisitação das coisas que tínhamos conversado — esta conversa anterior já foi há quase três anos…
Nuno:
Pois é, estive a ver aqui. Dezembro! Pois, são mesmo quase três anos.
Filipa:
(risos) Sim, sim, acho que era interessante tentarmos perceber que coisas possam fazer sentido actualizar, ou coisas que tu achas que já não fazem sentido dizer, ou achas que ainda está tudo completamente actual? …em relação às coisas que disseste sobre a floresta, e sobre, sei lá, a questão dos eucaliptos que foi bastante falada.
Nuno:
Sim, continua tudo actual. Eu faço parte assim de um grupo um bocado estranho que são as pessoas que estão por dentro da floresta: temos um grupo de pessoas que sabem o que está a passar, sabem o que é que está a correr mal, só que, ao mesmo tempo, conseguimos ter um discurso positivo. E há [outras] pessoas que, ás vezes (no facebook), ficam um pouco escandalizadas porque, por um lado há pessoas que têm aquela visão assim “beatífica” e simpática do país, do tipo “Ai, é verde e é bonito, os incêndios são maus, a floresta é bonita, e eu quando vou para o monte vejo muita floresta e é tudo porreiro…” E depois há pessoas com alguma consciência, e que sabem o que é um eucalipto e o que é um carvalho, e vêm poucos carvalhos e muitos eucaliptos e já viram a coisa ao contrário: “Isto é uma tragédia, porque os eucaliptos são muitos, há poucos carvalhos, não há lobos…” Mas eu estou num patamar intermédio — eu e outras pessoas — que é: sabemos dos problemas e percebemos a evolução das coisas e conseguimos olhar para elas de uma maneira diferente.
Como é que posso dizer isto?… Desde a Idade Média que não há tanta floresta, acho que é uma afirmação que eu posso [defender]… ou desde os “Ddescobrimentos” talvez, que não há tanta floresta, se calhar isso é mais exato. E depois a questão do eucalipto é outra: temos muito eucalipto, só que em essência o que deixamos de ter foi pinheiro, deixamos de ter pinheiros e passamos a ter muitos eucaliptos. Se agora há mais eucaliptos do que havia pinheiros? Não sei, é possível. Só que depois vamos a ver as áreas de sobreiro e de azinheira, que são as duas nativas folhosas mais representativas e as áreas não mudaram assim tanto, de sobreiro e de azinheira. E nunca houve tantos carvalhos, nunca houve tantos castanheiros, na Idade Moderna nunca houve. E ao mesmo tempo que temos dessas árvores em maior quantidade, começamos a ter sítios onde elas existem em tanta quantidade que já começam a criar ecossistemas de áreas contínuas de floresta, de carvalhal, de floresta mista. E agora está-se a fazer o Census do lobo e já se sabiam que existiam à volta de 300 lobos em Portugal, eu imagino que o novo Census vá dar um número maior, e nos últimos dois ou três anos houve duas presenças de urso em Portugal: é imbatível isso! Não dá para bater essa realidade. E depois olha-se para outras espécies, e por outros processos já existem linces na natureza, outra vez, em Portugal. Portanto, há muitas coisas que estão a dar uma grande volta. E é difícil a pessoa dizer: “Ok, pronto, eu percebo a luta dos eucaliptos, mas…” Há pessoas que ficam um bocado revoltadas com o “mas”: “Tipo o quê, estás a dizer coisas positivas? Não dá! Tu deves ser comprado pelos eucaliptos…” Devem pensar isso… pronto, é o que é.
No fundo, [queria fazer] uma espécie de revisitação das coisas que tínhamos conversado — esta conversa anterior já foi há quase três anos…
Nuno:
Pois é, estive a ver aqui. Dezembro! Pois, são mesmo quase três anos.
Filipa:
(risos) Sim, sim, acho que era interessante tentarmos perceber que coisas possam fazer sentido actualizar, ou coisas que tu achas que já não fazem sentido dizer, ou achas que ainda está tudo completamente actual? …em relação às coisas que disseste sobre a floresta, e sobre, sei lá, a questão dos eucaliptos que foi bastante falada.
Nuno:
Sim, continua tudo actual. Eu faço parte assim de um grupo um bocado estranho que são as pessoas que estão por dentro da floresta: temos um grupo de pessoas que sabem o que está a passar, sabem o que é que está a correr mal, só que, ao mesmo tempo, conseguimos ter um discurso positivo. E há [outras] pessoas que, ás vezes (no facebook), ficam um pouco escandalizadas porque, por um lado há pessoas que têm aquela visão assim “beatífica” e simpática do país, do tipo “Ai, é verde e é bonito, os incêndios são maus, a floresta é bonita, e eu quando vou para o monte vejo muita floresta e é tudo porreiro…” E depois há pessoas com alguma consciência, e que sabem o que é um eucalipto e o que é um carvalho, e vêm poucos carvalhos e muitos eucaliptos e já viram a coisa ao contrário: “Isto é uma tragédia, porque os eucaliptos são muitos, há poucos carvalhos, não há lobos…” Mas eu estou num patamar intermédio — eu e outras pessoas — que é: sabemos dos problemas e percebemos a evolução das coisas e conseguimos olhar para elas de uma maneira diferente.
Como é que posso dizer isto?… Desde a Idade Média que não há tanta floresta, acho que é uma afirmação que eu posso [defender]… ou desde os “Ddescobrimentos” talvez, que não há tanta floresta, se calhar isso é mais exato. E depois a questão do eucalipto é outra: temos muito eucalipto, só que em essência o que deixamos de ter foi pinheiro, deixamos de ter pinheiros e passamos a ter muitos eucaliptos. Se agora há mais eucaliptos do que havia pinheiros? Não sei, é possível. Só que depois vamos a ver as áreas de sobreiro e de azinheira, que são as duas nativas folhosas mais representativas e as áreas não mudaram assim tanto, de sobreiro e de azinheira. E nunca houve tantos carvalhos, nunca houve tantos castanheiros, na Idade Moderna nunca houve. E ao mesmo tempo que temos dessas árvores em maior quantidade, começamos a ter sítios onde elas existem em tanta quantidade que já começam a criar ecossistemas de áreas contínuas de floresta, de carvalhal, de floresta mista. E agora está-se a fazer o Census do lobo e já se sabiam que existiam à volta de 300 lobos em Portugal, eu imagino que o novo Census vá dar um número maior, e nos últimos dois ou três anos houve duas presenças de urso em Portugal: é imbatível isso! Não dá para bater essa realidade. E depois olha-se para outras espécies, e por outros processos já existem linces na natureza, outra vez, em Portugal. Portanto, há muitas coisas que estão a dar uma grande volta. E é difícil a pessoa dizer: “Ok, pronto, eu percebo a luta dos eucaliptos, mas…” Há pessoas que ficam um bocado revoltadas com o “mas”: “Tipo o quê, estás a dizer coisas positivas? Não dá! Tu deves ser comprado pelos eucaliptos…” Devem pensar isso… pronto, é o que é.
O território
MOTIVOS PARA A MUDANÇA
Filipa:
E tu tens ideias do que pode estar a criar estas mudanças positivas?
Nuno:
Por um lado temos o abandono da agricultura. O abandono da agricultura traz paisagens naturais. Claro, se temos um monte coberto de giestas isso não é natural, não é natural um monte só com uma espécie, ou um monte só com [espécies] invasoras. Mas essas paisagens estão antropomórficas e passamos a ter algo mais parecido com o que existia antes. Esse abandono da agricultura traz isso, e por outro lado, tínhamos áreas gigantescas de pinheiro em Portugal que eram geridas, fosse em [terrenos] baldios, portanto, áreas comunitárias, fossem em florestas públicas. Havia zonas muito grandes em Portugal em que a economia das aldeias funcionava à volta do pinheiro: a madeira, as pinhas [pinhão], lenha, resina, e isso foi tudo abandonado. Portanto, com o avanço do eucalipto houve um desinvestimento brutal no pinheiro, então o eucalipto tomou esse lugar. Só que tomou esse lugar numa situação em que já não existe economia rural como existia antigamente. Portanto, já não temos uma economia rural de floresta, portanto, temos algumas áreas do país onde o eucalipto é gerido de forma profissional, e, por mais que me custe, é como deve ser [gerido] o eucalipto: se é para ter eucalipto, é para produzir [celulose], ponto final. Dizem que o modelo de exploração do eucalipto é um modelo de gestão de abandono, que dizem que será dois terços ou três quartos do total da área de eucalipto em Portugal. O que significa que a maior parte do eucalipto em Portugal não tem gestão ativa: foi plantado ou algo meio espontâneo, mas só vão lá para o cortar.
O que significa que temos o abandono rural, um eucaliptal e pinhal abandonado, e no meio disto tudo começamos a ter um sub-bosque que nunca tivemos: de medronheiros, de carvalhos, de galerias ripícolas — há sítios agora com galeria ripícola, portanto, galerias ribeirinhas — incríveis, que não tínhamos há séculos, uma coisa assim. Há aqui um terreno perto da Póvoa, na saída da autoestrada, que era um eucaliptal que tinha sobreiros pelo meio e cheio de carvalhos — da estrada via-se, para o lado do Porto havia mesmo uma frente de carvalhos. O dono [do terrenos] chegou lá, cortou todos os eucaliptos, cortou [também] 100% dos carvalhos porque não lhe interessava ter carvalhos e deixou os sobreiros, mas os sobreiros ficaram lá. Portanto, alguma coisa está a acontecer. O que acontece em muitos sítios é que há carvalhos tão grandes debaixo de eucaliptos que já deixam bolota, portanto, que já estão a espalhar a semente pelos montes. Então é isso: com este regime de abondo rural e com a gestão de abandono do eucalipto e o abandono do pinheiro, temos zonas em Portugal que nunca estiveram assim.
E tu tens ideias do que pode estar a criar estas mudanças positivas?
Nuno:
Por um lado temos o abandono da agricultura. O abandono da agricultura traz paisagens naturais. Claro, se temos um monte coberto de giestas isso não é natural, não é natural um monte só com uma espécie, ou um monte só com [espécies] invasoras. Mas essas paisagens estão antropomórficas e passamos a ter algo mais parecido com o que existia antes. Esse abandono da agricultura traz isso, e por outro lado, tínhamos áreas gigantescas de pinheiro em Portugal que eram geridas, fosse em [terrenos] baldios, portanto, áreas comunitárias, fossem em florestas públicas. Havia zonas muito grandes em Portugal em que a economia das aldeias funcionava à volta do pinheiro: a madeira, as pinhas [pinhão], lenha, resina, e isso foi tudo abandonado. Portanto, com o avanço do eucalipto houve um desinvestimento brutal no pinheiro, então o eucalipto tomou esse lugar. Só que tomou esse lugar numa situação em que já não existe economia rural como existia antigamente. Portanto, já não temos uma economia rural de floresta, portanto, temos algumas áreas do país onde o eucalipto é gerido de forma profissional, e, por mais que me custe, é como deve ser [gerido] o eucalipto: se é para ter eucalipto, é para produzir [celulose], ponto final. Dizem que o modelo de exploração do eucalipto é um modelo de gestão de abandono, que dizem que será dois terços ou três quartos do total da área de eucalipto em Portugal. O que significa que a maior parte do eucalipto em Portugal não tem gestão ativa: foi plantado ou algo meio espontâneo, mas só vão lá para o cortar.
O que significa que temos o abandono rural, um eucaliptal e pinhal abandonado, e no meio disto tudo começamos a ter um sub-bosque que nunca tivemos: de medronheiros, de carvalhos, de galerias ripícolas — há sítios agora com galeria ripícola, portanto, galerias ribeirinhas — incríveis, que não tínhamos há séculos, uma coisa assim. Há aqui um terreno perto da Póvoa, na saída da autoestrada, que era um eucaliptal que tinha sobreiros pelo meio e cheio de carvalhos — da estrada via-se, para o lado do Porto havia mesmo uma frente de carvalhos. O dono [do terrenos] chegou lá, cortou todos os eucaliptos, cortou [também] 100% dos carvalhos porque não lhe interessava ter carvalhos e deixou os sobreiros, mas os sobreiros ficaram lá. Portanto, alguma coisa está a acontecer. O que acontece em muitos sítios é que há carvalhos tão grandes debaixo de eucaliptos que já deixam bolota, portanto, que já estão a espalhar a semente pelos montes. Então é isso: com este regime de abondo rural e com a gestão de abandono do eucalipto e o abandono do pinheiro, temos zonas em Portugal que nunca estiveram assim.
Regeneração
RETORNO DA FLORESTA NATIVA
Filipa:
É uma espécie de nova floresta nativa, selvagem. Achas que é esse sentido que pode estar a tomar em alguns pontos [do território]?
Nuno:
Sim, às vezes isto acontece em tantos sítios, que por vezes os projetos de reflorestação como muitos em que eu participei, quase que perdem sentido, porque a natureza recupera muito rapidamente.
Filipa:
Exatamente, ela regenera-se automaticamente, não precisa de nós.
Nuno:
Temos zonas do país (onde eu já andei), o antigo Pinhal Interior, que são as zonas dos incêndios, hoje em dia, agora chamam-lhe o “Eucaliptal Interior”, que, se não fizermos nada aí, demoramos séculos para voltar a ter floresta nativa, séculos. Isso se o ser humano desaparecer… nós sabemos que isso vai acontecer algum dia, não é? Mas tens outras zonas do país, onde basta dar um “jeitinho” aqui e ali e já tens uma floresta, não é preciso complicar muito.
É uma espécie de nova floresta nativa, selvagem. Achas que é esse sentido que pode estar a tomar em alguns pontos [do território]?
Nuno:
Sim, às vezes isto acontece em tantos sítios, que por vezes os projetos de reflorestação como muitos em que eu participei, quase que perdem sentido, porque a natureza recupera muito rapidamente.
Filipa:
Exatamente, ela regenera-se automaticamente, não precisa de nós.
Nuno:
Temos zonas do país (onde eu já andei), o antigo Pinhal Interior, que são as zonas dos incêndios, hoje em dia, agora chamam-lhe o “Eucaliptal Interior”, que, se não fizermos nada aí, demoramos séculos para voltar a ter floresta nativa, séculos. Isso se o ser humano desaparecer… nós sabemos que isso vai acontecer algum dia, não é? Mas tens outras zonas do país, onde basta dar um “jeitinho” aqui e ali e já tens uma floresta, não é preciso complicar muito.
Filipa:
E isso tem que ver com a flora local, com questões de clima, com vários fatores, certo?
Nuno:
Às vezes parece contraproducente, mas os incêndios podem acontecer em zonas onde chove mais, isso é normal, porque nas zonas onde chove mais, temos mais produtividade primária. Num sítio que tenha ardido, no espaço de cinco anos, nestas zonas mais próximas do litoral, conseguimos ter uma mata que arde com a mesma intensidade passados cinco anos, porque cresceram as giestas, cresceram eucaliptos, cresceu tudo porque chove muito. Em Trás-os-Montes, por exemplo, e outras zonas do interior, por um lado, se arder pode ser muito mau porque tem verões muito secos e muito quentes, mas por outro lado, como chove pouco, há pouca regeneração, é toda muito lenta, então cria-se menos lugar para aqueles incêndios ultra-intensos, como os de 2017. Porque até pode ter giestas e ter outras plantas que ardam “bem”, e pinheiros, mas não cresce com a mesma intensidade como as zonas da chuva.
Filipa:
E quais são os fatores que levam a que, como tu tinhas dito, que numas zonas a natureza regenera-se muito facilmente, e noutras só se as pessoas desaparecerem durante séculos? Tinhas dito que havia velocidades diferentes de regeneração. Eu queria perceber o que é que difere entre essas zonas, que fatores é que influenciam isso.
Nuno:
O distrito do Porto é a zona do país com mais ignições — penso que na conversa falei sobre isso — acho que é o norte litoral de Portugal que é a zona do mundo com mais ignições. Portanto, entre o Vouga e o Minho, é a zona do mundo com mais ignições, mas não é a zona com mais incêndios. Só temos incêndios nas serras lá para Viana do Castelo, perto do Gerês, é que há alguns incêndios grandes, mas, tendo em conta o número de ignições que há, não é nada. Mas, a zona do Pinhal Interior, e também, em 2017, o Pinhal Litoral — que nem existe essa definição, da zona de Leiria, dos pinhais clássicos portugueses — aí temos um regime generoso de pluviosidade, mas a gestão desapareceu, mesmo no pinhal de Leiria, mesmo nas zonas públicas, a gestão desapareceu. Na zona do Pinhal Interior a população desapareceu, portanto, não existem pessoas a fazer economia rural — a zona da Pampilhosa, aquilo são concelhos relativamente grandes com pouquíssima gente, e, por outro lado, os solos são muito pobres, portanto o que cresce lá são pinheiros e eucaliptos, neste momento. Claro que, se dermos espaço à natureza, crescem carvalhos e sobreiros e o que for, mas o que cresce rápido ali são os pinheiros e eucaliptos, não é mais nada, se calhar giestas também, e invasoras. Portanto, é isso, aquela é uma região onde os solos eram pobre e são cada vez mais pobres, não consegue ter a regeneração que temos no Minho: mais diversificada, com carvalhos a fecharem as copas, as galerias ripícolas a desenvolverem-se… Temos serras nuas, é o que cada vez temos mais.
E isso tem que ver com a flora local, com questões de clima, com vários fatores, certo?
Nuno:
Às vezes parece contraproducente, mas os incêndios podem acontecer em zonas onde chove mais, isso é normal, porque nas zonas onde chove mais, temos mais produtividade primária. Num sítio que tenha ardido, no espaço de cinco anos, nestas zonas mais próximas do litoral, conseguimos ter uma mata que arde com a mesma intensidade passados cinco anos, porque cresceram as giestas, cresceram eucaliptos, cresceu tudo porque chove muito. Em Trás-os-Montes, por exemplo, e outras zonas do interior, por um lado, se arder pode ser muito mau porque tem verões muito secos e muito quentes, mas por outro lado, como chove pouco, há pouca regeneração, é toda muito lenta, então cria-se menos lugar para aqueles incêndios ultra-intensos, como os de 2017. Porque até pode ter giestas e ter outras plantas que ardam “bem”, e pinheiros, mas não cresce com a mesma intensidade como as zonas da chuva.
Filipa:
E quais são os fatores que levam a que, como tu tinhas dito, que numas zonas a natureza regenera-se muito facilmente, e noutras só se as pessoas desaparecerem durante séculos? Tinhas dito que havia velocidades diferentes de regeneração. Eu queria perceber o que é que difere entre essas zonas, que fatores é que influenciam isso.
Nuno:
O distrito do Porto é a zona do país com mais ignições — penso que na conversa falei sobre isso — acho que é o norte litoral de Portugal que é a zona do mundo com mais ignições. Portanto, entre o Vouga e o Minho, é a zona do mundo com mais ignições, mas não é a zona com mais incêndios. Só temos incêndios nas serras lá para Viana do Castelo, perto do Gerês, é que há alguns incêndios grandes, mas, tendo em conta o número de ignições que há, não é nada. Mas, a zona do Pinhal Interior, e também, em 2017, o Pinhal Litoral — que nem existe essa definição, da zona de Leiria, dos pinhais clássicos portugueses — aí temos um regime generoso de pluviosidade, mas a gestão desapareceu, mesmo no pinhal de Leiria, mesmo nas zonas públicas, a gestão desapareceu. Na zona do Pinhal Interior a população desapareceu, portanto, não existem pessoas a fazer economia rural — a zona da Pampilhosa, aquilo são concelhos relativamente grandes com pouquíssima gente, e, por outro lado, os solos são muito pobres, portanto o que cresce lá são pinheiros e eucaliptos, neste momento. Claro que, se dermos espaço à natureza, crescem carvalhos e sobreiros e o que for, mas o que cresce rápido ali são os pinheiros e eucaliptos, não é mais nada, se calhar giestas também, e invasoras. Portanto, é isso, aquela é uma região onde os solos eram pobre e são cada vez mais pobres, não consegue ter a regeneração que temos no Minho: mais diversificada, com carvalhos a fecharem as copas, as galerias ripícolas a desenvolverem-se… Temos serras nuas, é o que cada vez temos mais.
Árvores da cidade
FENÓMENOS URBANOS
Filipa:
Já não sei bem o que te ia perguntar…
Nuno:
Mas olha Filipa, sinto-me muito lisonjeado com isto tudo isto…
Filipa:
Porquê? (Risos) Eu acho que isto tem pano para mangas, eu é que não percebo o suficiente desta matéria, e se calhar, porque quero perceber mais também acho que é importante partilhar estes conteúdos. Acho-os mesmo muito importantes, e acho que muitas das coisas que tu dizes, elas vão contra aquilo que eu acho que são mitos que as pessoas começam absorver do que ouvem, na opinião pública e nos media. Como aquilo que estavas a dizer no início: não há só coisas más, não é? Não é só incêndios e eucaliptos, também há outras coisas a acontecerem, e eu acho que se as pessoas não tiverem noção do que é que se está a passar… Eu acho que há muita desinformação no que toca ao ambiente, em Portugal. Em geral, acho que no tema do ambiente é muito difícil de se encontrar informação fidedigna, mas acho que há aqui informações super interessantes, até para as pessoas que se interessam poderem pesquisar mais. Dos temas que a mim mais me interessa atualmente, até é — eu por acaso não te enviei, mas eu, no fim-de-semana anterior escrevi… eu tenho por hábito enviar uma newsletter mais ou menos mensalmente, e desta vez escrevi sobre um tema do qual sei muito pouco, ou seja, não era um tema que ver com a floresta, mas tem que ver com árvores, mas na cidade, que é outro tema completamente diferente. E pronto, no fundo acabei por fazer uma ligação entre as questões da gentrificação e daquilo que se está a fazer especificamente na cidade do Porto — mas imagino que noutras cidades tomadas pelos mesmos processos, também se esteja a passar o mesmo — e no Porto, acho que se tem assistido à destruição de muitos jardins, à retirada de muitas árvores, sem se perceber muito bem se isso é uma coisa que deve acontecer ou não, que está a ser feita pelos melhores motivos ou não, e acho que isto é tudo muito, pelo que eu vejo, nos vários casos, há aqui uma espécie de pulsão construtora, de construir a todo o custo. Acho que durante a pandemia nunca se construiu tanto, aliás, acho que foi a estatística que ouvi recentemente, que nunca houve tantas licenças de construção [na cidade], e de repente, eu acho que as pessoas… eu pelo menos tenho essa sensação, eu não vivo muito perto do centro, mas o suficiente, e vivo numa zona que está completamente em processo construtivo e reconstrutivo, vêem-se obras por todo lado. Eu queria relacionar isto com a questão da impermeabilização dos solos, e com as políticas de ambiente na cidade, que me parecem inexistentes, pelo menos no caso da cidade do Porto. E agora era a questão de fazeres um comentário, dizeres o que é que tu achas, pessoalmente, sobre essa questão.
Nuno:
Por acaso no outro dia, fiz assim um bocado de advogado do diabo numa caixa de comentários de facebook… era uma pessoa que tinha aquele discurso do drama que era: “Estão a cortar tudo, já não sobram árvores no Porto e é uma vergonha.” E eu disse que não queria estar a contrariar mas… De facto, houve situações, acho que foi a própria pessoa que falou de quando cortaram aquelas tílias entre a Praça da República e a Igreja da Lapa, uma coisa inacreditável… Umas tílias que ainda estão lá os cepos, uma tílias incríveis, nunca percebi porquê que fizeram aquilo. E houve outros cortes recentes surreais, ao falar no óbvio: destruíram a Praça da Galiza, aquele bosque de freixos e depois, o ridículo, uma obra de autor, agora entregaram a obra ao Souto-Moura e não interessa quem é que construiu isto, o Souto-Moura é que vai reconstruir, não interessa quem foi a arquiteta paisagista… uma coisa inacreditável.
Já não sei bem o que te ia perguntar…
Nuno:
Mas olha Filipa, sinto-me muito lisonjeado com isto tudo isto…
Filipa:
Porquê? (Risos) Eu acho que isto tem pano para mangas, eu é que não percebo o suficiente desta matéria, e se calhar, porque quero perceber mais também acho que é importante partilhar estes conteúdos. Acho-os mesmo muito importantes, e acho que muitas das coisas que tu dizes, elas vão contra aquilo que eu acho que são mitos que as pessoas começam absorver do que ouvem, na opinião pública e nos media. Como aquilo que estavas a dizer no início: não há só coisas más, não é? Não é só incêndios e eucaliptos, também há outras coisas a acontecerem, e eu acho que se as pessoas não tiverem noção do que é que se está a passar… Eu acho que há muita desinformação no que toca ao ambiente, em Portugal. Em geral, acho que no tema do ambiente é muito difícil de se encontrar informação fidedigna, mas acho que há aqui informações super interessantes, até para as pessoas que se interessam poderem pesquisar mais. Dos temas que a mim mais me interessa atualmente, até é — eu por acaso não te enviei, mas eu, no fim-de-semana anterior escrevi… eu tenho por hábito enviar uma newsletter mais ou menos mensalmente, e desta vez escrevi sobre um tema do qual sei muito pouco, ou seja, não era um tema que ver com a floresta, mas tem que ver com árvores, mas na cidade, que é outro tema completamente diferente. E pronto, no fundo acabei por fazer uma ligação entre as questões da gentrificação e daquilo que se está a fazer especificamente na cidade do Porto — mas imagino que noutras cidades tomadas pelos mesmos processos, também se esteja a passar o mesmo — e no Porto, acho que se tem assistido à destruição de muitos jardins, à retirada de muitas árvores, sem se perceber muito bem se isso é uma coisa que deve acontecer ou não, que está a ser feita pelos melhores motivos ou não, e acho que isto é tudo muito, pelo que eu vejo, nos vários casos, há aqui uma espécie de pulsão construtora, de construir a todo o custo. Acho que durante a pandemia nunca se construiu tanto, aliás, acho que foi a estatística que ouvi recentemente, que nunca houve tantas licenças de construção [na cidade], e de repente, eu acho que as pessoas… eu pelo menos tenho essa sensação, eu não vivo muito perto do centro, mas o suficiente, e vivo numa zona que está completamente em processo construtivo e reconstrutivo, vêem-se obras por todo lado. Eu queria relacionar isto com a questão da impermeabilização dos solos, e com as políticas de ambiente na cidade, que me parecem inexistentes, pelo menos no caso da cidade do Porto. E agora era a questão de fazeres um comentário, dizeres o que é que tu achas, pessoalmente, sobre essa questão.
Nuno:
Por acaso no outro dia, fiz assim um bocado de advogado do diabo numa caixa de comentários de facebook… era uma pessoa que tinha aquele discurso do drama que era: “Estão a cortar tudo, já não sobram árvores no Porto e é uma vergonha.” E eu disse que não queria estar a contrariar mas… De facto, houve situações, acho que foi a própria pessoa que falou de quando cortaram aquelas tílias entre a Praça da República e a Igreja da Lapa, uma coisa inacreditável… Umas tílias que ainda estão lá os cepos, uma tílias incríveis, nunca percebi porquê que fizeram aquilo. E houve outros cortes recentes surreais, ao falar no óbvio: destruíram a Praça da Galiza, aquele bosque de freixos e depois, o ridículo, uma obra de autor, agora entregaram a obra ao Souto-Moura e não interessa quem é que construiu isto, o Souto-Moura é que vai reconstruir, não interessa quem foi a arquiteta paisagista… uma coisa inacreditável.
Jardim de Sophia
UM JARDIM DESTRUÍDO
Filipa:
Sim. Essa questão é-me muito cara porque acho que aquele processo foi todo uma vergonha, e esta ideia de que ali vai nascer o mesmo jardim, que é uma espécie de “lavagem”… é uma coisa que fizeram para calar as pessoas. Puseram lá uns tapumes a dizer “Jardim de Sophia”, quando aquilo nunca vai ser o mesmo jardim.
Nuno:
Sim, tem assim [imagens de] folhas e árvores nos tapumes…
Filipa:
Aquilo nunca vai ser a mesma coisa porque as árvores tiveram de desaparecer dali, o que quer que surja ali por cima vai ser outro jardim, e vai ser um jardim impermeabilizado porque tem uma estação de metro por baixo. Acho que houve, de uma forma assim mais óbvia, este caso acho que é muito crasso, no Jardim do Carregal, onde vai haver a paragem anterior desta linha de metro, também li uma série de artigos muito contraditórios em que os responsáveis alegaram retirar árvores porque estavam doentes e as associações ambientais diziam que tinham retirado árvores que não era suposto serem retiradas, ou seja, que abriram assim uma espécie de clareira no Jardim do Carregal, e que isso não ficou assim muito esclarecido porquê que foram retiradas as árvores que, pelos vistos, não eram necessário serem retiradas. Mas acho que há bastantes outros casos, um deles que me deixou um bocadinho perplexa, o anúncio do novo edifício que vai surgir em Serralves, é um edifício privado numa zona privada, mas enfim, com o que Serralves significa culturalmente e simbolicamente na cidade, e onde há uma zona de azinheiras penso eu, que teriam que ser removidas do jardim para [dar lugar a] esse edifício, e acho que já existem queixas de uma associação que acha que não faz sentido nenhum estar a retirar mais árvores do jardim para construir um edifício… a sugestão que essa associação dá é que pudesse até haver uma espécie de pólo de Serralves numa outra zona da cidade. Como é que tu vês isto, achas que estas coisas estão relacionadas com o mesmo tipo de políticas ou achas que são episódios que não têm relação entre si?
Nuno:
Eu espero que as coisas estejam a mudar, sabes que houve uma lei, que é o Regulamento de Árvores Urbanas [Regime Jurídico do Arvoredo Urbano], que foi aprovado no parlamento, e agora vai ser criada a profissão de arborista (há agora um período de não sei quanto tempo para ser implementada), uma coisa que não existia em Portugal. E já há concelhos com esses regulamentos avançados, em Lousada (por exmeplo) e, se calhar, foi o facto de Lisboa ter já um regulamento que foi criada uma lei a nível nacional, as coisas costumam acontecer assim. Em relação ao Porto, uma coisa que também é interessante, na página da Câmara [Municipal] do Porto (CMP), existe uma secção dedicada ao arvoredo urbano e existe um serviço, que é um sítio onde podes perceber onde vão fazer intervenções e onde foram feitas intervenções, e a pessoa consegue, se seguir a página, saber se vão cortar árvores aqui e ali, e podes também perceber qual foi a razão apresentada pela CMP para cortar [árvores] em certos sítios. É uma coisa mais transparente. Eu entrei em contacto com a CMP quando cortaram um carvalho em Cedofeita, junto à entrada da Igreja [de Cedofeita], um carvalho bem antigo. E eles apresentaram uma razão técnica, disseram que a árvore tinha um “dieback”, uma coisa que mata muito rapidamente, e pronto, cortaram aquele carvalho e puseram lá um carvalho de estufa vindo sei lá de onde, já assim com dois metros e tal de altura, não substitui, não é? Então são essas duas coisas, o regulamento urbano de arvoredo e essa página da CMP que acho que é muito interessante. Eu não estou a dizer que as coisas funcionam bem, estou a dizer que existem agora ferramentas para as pessoas perceberem o que vai acontecer e também pressionarem a CMP.
Filipa:
Claro. E estarem atentas.
Sim. Essa questão é-me muito cara porque acho que aquele processo foi todo uma vergonha, e esta ideia de que ali vai nascer o mesmo jardim, que é uma espécie de “lavagem”… é uma coisa que fizeram para calar as pessoas. Puseram lá uns tapumes a dizer “Jardim de Sophia”, quando aquilo nunca vai ser o mesmo jardim.
Nuno:
Sim, tem assim [imagens de] folhas e árvores nos tapumes…
Filipa:
Aquilo nunca vai ser a mesma coisa porque as árvores tiveram de desaparecer dali, o que quer que surja ali por cima vai ser outro jardim, e vai ser um jardim impermeabilizado porque tem uma estação de metro por baixo. Acho que houve, de uma forma assim mais óbvia, este caso acho que é muito crasso, no Jardim do Carregal, onde vai haver a paragem anterior desta linha de metro, também li uma série de artigos muito contraditórios em que os responsáveis alegaram retirar árvores porque estavam doentes e as associações ambientais diziam que tinham retirado árvores que não era suposto serem retiradas, ou seja, que abriram assim uma espécie de clareira no Jardim do Carregal, e que isso não ficou assim muito esclarecido porquê que foram retiradas as árvores que, pelos vistos, não eram necessário serem retiradas. Mas acho que há bastantes outros casos, um deles que me deixou um bocadinho perplexa, o anúncio do novo edifício que vai surgir em Serralves, é um edifício privado numa zona privada, mas enfim, com o que Serralves significa culturalmente e simbolicamente na cidade, e onde há uma zona de azinheiras penso eu, que teriam que ser removidas do jardim para [dar lugar a] esse edifício, e acho que já existem queixas de uma associação que acha que não faz sentido nenhum estar a retirar mais árvores do jardim para construir um edifício… a sugestão que essa associação dá é que pudesse até haver uma espécie de pólo de Serralves numa outra zona da cidade. Como é que tu vês isto, achas que estas coisas estão relacionadas com o mesmo tipo de políticas ou achas que são episódios que não têm relação entre si?
Nuno:
Eu espero que as coisas estejam a mudar, sabes que houve uma lei, que é o Regulamento de Árvores Urbanas [Regime Jurídico do Arvoredo Urbano], que foi aprovado no parlamento, e agora vai ser criada a profissão de arborista (há agora um período de não sei quanto tempo para ser implementada), uma coisa que não existia em Portugal. E já há concelhos com esses regulamentos avançados, em Lousada (por exmeplo) e, se calhar, foi o facto de Lisboa ter já um regulamento que foi criada uma lei a nível nacional, as coisas costumam acontecer assim. Em relação ao Porto, uma coisa que também é interessante, na página da Câmara [Municipal] do Porto (CMP), existe uma secção dedicada ao arvoredo urbano e existe um serviço, que é um sítio onde podes perceber onde vão fazer intervenções e onde foram feitas intervenções, e a pessoa consegue, se seguir a página, saber se vão cortar árvores aqui e ali, e podes também perceber qual foi a razão apresentada pela CMP para cortar [árvores] em certos sítios. É uma coisa mais transparente. Eu entrei em contacto com a CMP quando cortaram um carvalho em Cedofeita, junto à entrada da Igreja [de Cedofeita], um carvalho bem antigo. E eles apresentaram uma razão técnica, disseram que a árvore tinha um “dieback”, uma coisa que mata muito rapidamente, e pronto, cortaram aquele carvalho e puseram lá um carvalho de estufa vindo sei lá de onde, já assim com dois metros e tal de altura, não substitui, não é? Então são essas duas coisas, o regulamento urbano de arvoredo e essa página da CMP que acho que é muito interessante. Eu não estou a dizer que as coisas funcionam bem, estou a dizer que existem agora ferramentas para as pessoas perceberem o que vai acontecer e também pressionarem a CMP.
Filipa:
Claro. E estarem atentas.
Podas municipais
TRADIÇÃO E IGNORÂNCIA
Nuno:
Mas em geral nas Câmaras portuguesas — na CMP notou-se muito — houve uma evolução brutal nos últimos 20 anos, disso não há dúvida nenhuma. No sentido em que as árvores de alinhamento, nomeadamente, que no Porto, (é como Londres) tens o plátano da [estrada da] Circunvalação, que é assim omnipresente. Tens na Circunvalação, tens na Avenida AEP, tens no Jardim de Arca D’Água e tens no jardim da Corujeira: eles agora deixam as árvores crescer. Deixou de haver aquele política da poda municipal da CMP. Tirando algumas situações específicas, isso desapareceu na CMP. Por exemplo, Vila do Conde ficou famosa este ano com uma poda municipal nuns plátanos, naquela zona central da feira de artesanato. Fizeram uma poda municipal naqueles plátanos todos, e toda a gente ficou escandalizada (quem percebe do assunto). Eu acho que é cada vez menos vulgar, a poda municipal. Mas por exemplo, ainda não sei porque é que ao lado do Jardim de Sophia, tens uma árvores, que não são as mais interessantes do mundo, são uns ligustros japoneses, que até podem ter comportamento evasor (já estão a aparecer por todo o lado), que vão desde o Palácio, pela Júlio Dinis até à 5 de Outubro, é sempre a mesma árvore: eles podam-nas todos os anos de uma maneira ultra-intensiva, ficam uns toquinhos. E tu consegues ver os ligustros em jardins privados, e nalguns sítios onde cresceram espontaneamente, são árvores bonitas, têm um aspecto natural, e ali todos os anos são ultra-podadas e depois ela rebenta muito, fica assim um tufo. Mas é um esforço gigantesco da CMP que ainda não consegui perceber porquê que aqueles ligustros são podados todos os anos. O que eu estou a dizer, mais uma vez, é que se há coisas que estão a funcionar muito mal, há outras que estão a funcionar melhor do que antes.
Filipa:
Na questão da poda achas que está a haver uma grande diferença?
Nuno:
Sim, uma diferença da noite para o dia. Olha, à beira de minha casa foi classificada como árvore de interesse público o tulipeiro da Casa das Artes, que é a arvore mais linda do Porto, e não estava classificada e há lá várias árvores de interesse público. Muito fixe.
Filipa:
Mas então dizias que antigamente havia esta política de podar as árvores constantemente, e que agora está-se a perder essa tendência?
Nuno:
É a poda da ignorância, é a “tradição”: “Eu faço sempre igual”. “Todos os anos fazemos igual, não vamos questionar isto”. Os diretores de serviço não tinham formação na área, não percebiam nada de podas. Existe uma especialidade que é o “cirurgião de árvores” desse tipos de podas. Portanto, numa árvore de sombra, que é o caso da árvore urbana, é a única função dela, é paisagística e fornece sombra, só se fazem podas por razões sanitárias (se ela está com alguma doença), para reduzir alguma densidade na copa (se ela está a crescer torta, dá-se-lhe um jeito para ela crescer a direito), e se são podas feitas na altura certa, a árvore sofre muito e ela cresce bem. Não há nenhuma razão técnica, mas nenhuma razão, para podar todos os anos ou de dois em dois anos. Nenhuma.
Filipa:
Este ano por acaso isso aconteceu na Avenida Rodrigues de Freitas, e segundo me disseram, é feito todos os anos.
Nuno:
A poda municipal voltou, a sério?
Filipa:
Eu acho que estavam a fazer em todas, pelo menos durante duas semanas, em junho ou julho, já não me recordo.
Nuno:
Em Rodrigues de Freitas não sei que árvores existem lá, mas sei que há árvores que já sofreram tanto, não sei se são plátanos. Tem lá árvores tão tortinhas, por causa dessas podas, porque o plátano, planta-se e poda-se porque ele aguenta, não quer dizer que ele goste. É a árvore que aguenta mais a poda, mas é um contra-senso, então porquê que os estás a plantar se os tens de podar? Então plantem-se outra árvores. Não temos de podar os plátanos, eles não precisam das podas, não servem para nada. Outra coisa que eu queria dizer, os funcionários da Câmara, que são pessoas porreiras, eu conheço muitas dos serviços de jardinagem, são pessoas que vêm normalmente de aldeias e estão habituadas a [árvores] fruteiras, as fruteiras podam-se, faz parte da produção de fruta e eles acham que uma árvore de rua é uma fruteira, pronto, é isso.
Filipa:
É mesmo ignorância.
Nuno:
Sim, ignorância deles e ignorância de quem manda. E dizem que em Vila do Conde foi o [próprio] Presidente da Câmara que disse para podarem as árvores. Como também agora em Matosinhos junto ao mar também foram podar metrosideros que é o que há ali, mas era por causa da vista, as pessoas estavam sem vista, portanto foram cortar as árvores. Às vezes, nas Câmaras os presidentes e vereadores lembram-se destas coisas, que qualquer dia é crime. A partir do momento em que existem regulamentos municipais e está tudo em decreto de lei, há certas coisas que já não se podem fazer. a situação mais paradigmática da ignorância [neste tema] foi aquele sítio na Madeira onde morreram 13 pessoas debaixo de um carvalho. Era um sítio de festas, tinha uma igreja com plátanos à volta e no limite dessa zona de festas tinha uma encosta com um carvalho, o carvalho não está lá a fazer nada, aquilo é um clima sub-tropical e tinha lá um carvalho dos “nossos”. O pessoal estava lá debaixo a fazer um piquenique e morreram as 13 pessoas debaixo do carvalho. Depois vieram dizer que até queriam cortar as árvores e podá-las. Houve responsáveis da câmara que foram a tribunal, acho que o próprio presidente foi a tribunal para responder por isso e há uns meses atrás cortaram todos os plátanos, todos. o que é que isso ajuda? Não foram os plátanos que caíram, foi um carvalho. Eles acharam: “Pronto, agora vamos deixar de ter árvores”. E cortaram todas as árvores à volta daquela igreja. Portanto, claro que as pessoas têm de ser responsabilizadas porque aquela árvore tinha de estar sinalizada, mas a culpa não é da árvores. Se tens um espaço público tens de cuidar do espaço público, seja da segurança de um passeio, de uma guarda para não cair uma ribanceira, qualquer coisa, isso é cuidar do espaço público. Cuidar das árvores é cuidar do espaço público. Portanto, a culpa não é da árvores é de quem cuida. ●
Mas em geral nas Câmaras portuguesas — na CMP notou-se muito — houve uma evolução brutal nos últimos 20 anos, disso não há dúvida nenhuma. No sentido em que as árvores de alinhamento, nomeadamente, que no Porto, (é como Londres) tens o plátano da [estrada da] Circunvalação, que é assim omnipresente. Tens na Circunvalação, tens na Avenida AEP, tens no Jardim de Arca D’Água e tens no jardim da Corujeira: eles agora deixam as árvores crescer. Deixou de haver aquele política da poda municipal da CMP. Tirando algumas situações específicas, isso desapareceu na CMP. Por exemplo, Vila do Conde ficou famosa este ano com uma poda municipal nuns plátanos, naquela zona central da feira de artesanato. Fizeram uma poda municipal naqueles plátanos todos, e toda a gente ficou escandalizada (quem percebe do assunto). Eu acho que é cada vez menos vulgar, a poda municipal. Mas por exemplo, ainda não sei porque é que ao lado do Jardim de Sophia, tens uma árvores, que não são as mais interessantes do mundo, são uns ligustros japoneses, que até podem ter comportamento evasor (já estão a aparecer por todo o lado), que vão desde o Palácio, pela Júlio Dinis até à 5 de Outubro, é sempre a mesma árvore: eles podam-nas todos os anos de uma maneira ultra-intensiva, ficam uns toquinhos. E tu consegues ver os ligustros em jardins privados, e nalguns sítios onde cresceram espontaneamente, são árvores bonitas, têm um aspecto natural, e ali todos os anos são ultra-podadas e depois ela rebenta muito, fica assim um tufo. Mas é um esforço gigantesco da CMP que ainda não consegui perceber porquê que aqueles ligustros são podados todos os anos. O que eu estou a dizer, mais uma vez, é que se há coisas que estão a funcionar muito mal, há outras que estão a funcionar melhor do que antes.
Filipa:
Na questão da poda achas que está a haver uma grande diferença?
Nuno:
Sim, uma diferença da noite para o dia. Olha, à beira de minha casa foi classificada como árvore de interesse público o tulipeiro da Casa das Artes, que é a arvore mais linda do Porto, e não estava classificada e há lá várias árvores de interesse público. Muito fixe.
Filipa:
Mas então dizias que antigamente havia esta política de podar as árvores constantemente, e que agora está-se a perder essa tendência?
Nuno:
É a poda da ignorância, é a “tradição”: “Eu faço sempre igual”. “Todos os anos fazemos igual, não vamos questionar isto”. Os diretores de serviço não tinham formação na área, não percebiam nada de podas. Existe uma especialidade que é o “cirurgião de árvores” desse tipos de podas. Portanto, numa árvore de sombra, que é o caso da árvore urbana, é a única função dela, é paisagística e fornece sombra, só se fazem podas por razões sanitárias (se ela está com alguma doença), para reduzir alguma densidade na copa (se ela está a crescer torta, dá-se-lhe um jeito para ela crescer a direito), e se são podas feitas na altura certa, a árvore sofre muito e ela cresce bem. Não há nenhuma razão técnica, mas nenhuma razão, para podar todos os anos ou de dois em dois anos. Nenhuma.
Filipa:
Este ano por acaso isso aconteceu na Avenida Rodrigues de Freitas, e segundo me disseram, é feito todos os anos.
Nuno:
A poda municipal voltou, a sério?
Filipa:
Eu acho que estavam a fazer em todas, pelo menos durante duas semanas, em junho ou julho, já não me recordo.
Nuno:
Em Rodrigues de Freitas não sei que árvores existem lá, mas sei que há árvores que já sofreram tanto, não sei se são plátanos. Tem lá árvores tão tortinhas, por causa dessas podas, porque o plátano, planta-se e poda-se porque ele aguenta, não quer dizer que ele goste. É a árvore que aguenta mais a poda, mas é um contra-senso, então porquê que os estás a plantar se os tens de podar? Então plantem-se outra árvores. Não temos de podar os plátanos, eles não precisam das podas, não servem para nada. Outra coisa que eu queria dizer, os funcionários da Câmara, que são pessoas porreiras, eu conheço muitas dos serviços de jardinagem, são pessoas que vêm normalmente de aldeias e estão habituadas a [árvores] fruteiras, as fruteiras podam-se, faz parte da produção de fruta e eles acham que uma árvore de rua é uma fruteira, pronto, é isso.
Filipa:
É mesmo ignorância.
Nuno:
Sim, ignorância deles e ignorância de quem manda. E dizem que em Vila do Conde foi o [próprio] Presidente da Câmara que disse para podarem as árvores. Como também agora em Matosinhos junto ao mar também foram podar metrosideros que é o que há ali, mas era por causa da vista, as pessoas estavam sem vista, portanto foram cortar as árvores. Às vezes, nas Câmaras os presidentes e vereadores lembram-se destas coisas, que qualquer dia é crime. A partir do momento em que existem regulamentos municipais e está tudo em decreto de lei, há certas coisas que já não se podem fazer. a situação mais paradigmática da ignorância [neste tema] foi aquele sítio na Madeira onde morreram 13 pessoas debaixo de um carvalho. Era um sítio de festas, tinha uma igreja com plátanos à volta e no limite dessa zona de festas tinha uma encosta com um carvalho, o carvalho não está lá a fazer nada, aquilo é um clima sub-tropical e tinha lá um carvalho dos “nossos”. O pessoal estava lá debaixo a fazer um piquenique e morreram as 13 pessoas debaixo do carvalho. Depois vieram dizer que até queriam cortar as árvores e podá-las. Houve responsáveis da câmara que foram a tribunal, acho que o próprio presidente foi a tribunal para responder por isso e há uns meses atrás cortaram todos os plátanos, todos. o que é que isso ajuda? Não foram os plátanos que caíram, foi um carvalho. Eles acharam: “Pronto, agora vamos deixar de ter árvores”. E cortaram todas as árvores à volta daquela igreja. Portanto, claro que as pessoas têm de ser responsabilizadas porque aquela árvore tinha de estar sinalizada, mas a culpa não é da árvores. Se tens um espaço público tens de cuidar do espaço público, seja da segurança de um passeio, de uma guarda para não cair uma ribanceira, qualquer coisa, isso é cuidar do espaço público. Cuidar das árvores é cuidar do espaço público. Portanto, a culpa não é da árvores é de quem cuida. ●
Agradeço ao Nuno Gomes Lopes, pela disponibilidade para esta conversa tão rica e que espero que vos inspire a ter muitas outras sobre os mesmos temas.
Como desaparecem as árvores
9 OUTUBRO 2021
Há uns dias atrás senti que me tinham tirado o chão debaixo dos pés. Quando cheguei à escola onde costumo ir votar não reparei imediatamente nas mudanças, talvez fosse do frenesim que me acomete na hora de votar, que me deixa absorta, mas mal saí para o pátio de entrada da escola e procurei com os olhos a árvore que fotógrafo todas as vezes que a visito em dia de eleições, e reparei que tinha desaparecido. A árvore grande da escola, a árvore onde a escola se parecia sustentar, já não estava ali. Em vez dela, uma cobertura em chapa ondulada, desde a entrada e depois paralela ao edifício, ajudaria os alunos a chegarem menos molhados à escola em dias de chuva. Junto a esta estrutura dois conjuntos de mesa rodeadas de cadeiras fixas. Do outro lado, um parque de jogos fechado por uma grade alta parecia reduzir todo aquele espaço a muito pouco. O pavimento também parecia ter sido modificado. Em vez do alcatrão escuro que cobria aquele grande pátio, o espaço desenhava-se agora com grandes lajes de cimento, pintado de amarelo na zona da estrutura para jogos, onde se viam marcações a branco para diferentes modalidades.
Talvez tenha sido uma ingenuidade minha, coisas às quais me agarro por que me levam às imagens que guardo da minha infância. A minha escola primária, onde votei pela primeira vez aos 18 anos, tinha também uma grande árvore imponente, mesmo à entrada da escola, no pátio frontal. Essa árvore era uma alegoria das quatro estações, e um abrigo nos dias em que esperava que me viessem buscar à escola. Era um mastro. E quis ver nesta árvore, nesta escola, a mesma memória. Porque a fotografava a cada eleição chamava-lhe a árvore da democracia, mas queria imaginar crianças enérgicas a brincar diariamente à sua sombra, e a verem as estações desenhadas nos seus ramos. Talvez seja só esta memória que me tenha deixado tão desapontada com aquele desaparecimento, mas a verdade é que reparei sempre no desaparecimento das árvores de um lugar: se há novas árvores parece que sempre estiveram ali, mas quando são arrancadas de onde sempre estiveram, é como se me arrancassem uma parte do corpo. Um jardim despido, uma clareira recente, uma escola sem árvores.
Se calhar é um passo maior que a perna, mas creio que há espaço para algumas metáforas, das árvores à cidade, da escola à política (da polis). Na cidade onde vivo, tal como no pátio desta escola, têm arrancado muitas árvores e parece que vão arrancar mais (nem mesmo Serralves parece não resistir a esta compulsão construtora). Sim, são necessários serviços, transportes e habitação, mas o grosso desta compulsão por construir mais e destruir áreas verdes na cidade é largamente guiada por políticas que beneficiam apenas um grupo muito restrito de pessoas: investidores privados, unidades hoteleiras, imobiliárias e o mercado turístico da cidade. Se passamos anos a ver casas abandonadas na cidade, hoje essas casas estão a ser esventradas por dentro para fazer unidades de habitação que nunca serão acessíveis ao cidadão comum. A nova linha de metro, concentrada no centro da cidade, é incompreensível (como prioridade), quando as zonas suburbanas da cidade têm actualmente mais acessos por metro que as freguesias da cidade que ficam mais longe do centro (caso da zona ocidental da cidade, com graves falhas de mobilidade). As políticas permissivas do carro são um desincentivo à utilização de meios alternativos de mobilidade, como a bicicleta ou simplesmente andar a pé. As ruas pedonais são diabolizadas pelos comerciantes (ou pelas associações destes) e o estacionamento é escasso e caro. Os transportes, ao fim deste ano e meio, estão novamente cheios e em greves constantes, mas qualquer ideia sobre reduzir o tráfego dentro da cidade é mal visto. As políticas ambientais são nulas e o horror ao verde perpetua-se. Os jardins são modificados e impermeabilizados, com vantagens incertas do ponto de vista ambiental.
Em vez de avançarmos da casa de partida, parece que só recuamos em relação ao que se apresentava como prioritário há pouco mais de dois anos atrás: a emergência climática, a urgência habitacional, um novo paradigma para uma cidade com menos habitantes mas muitos mais visitantes que exigiria uma nova visão de mobilidade.
Enquanto as árvores vão sendo arrancadas para cada monte de cimento que nascerá aí, nesta suposta inevitabilidade de crescimento perpétuo das cidades, tal como a economia, que (alegadamente) definha quando pára de crescer — temos todos um papel acrescido como cidadãos: escrutinar estas ações, fazer perguntas, assinar petições, juntarmo-nos a grupos informais ou coletivos activistas, onde há mais informação e trabalho colaborativo para encontrar soluções. Se nos acomodarmos à ideia de que não podemos nada contra quem “manda”, que somos os Davids destes Golias, estamos a perder mais uma oportunidade de inverter o caminho errante da democracia. Participar é tanto um direito como uma obrigação, e pode passar por muitas formas diferentes, mas deve, sobretudo, deixar-nos alerta e atentos. Para que não acordemos em cidades feitas de betão, com trânsito interminável e sem transportes. Para que possamos replantar todas as árvores, de todas as escolas e jardins, que foram cortadas nesta voragem.
E na vossa cidade, as árvores continuam de pé?
AMBIENTE
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Talvez tenha sido uma ingenuidade minha, coisas às quais me agarro por que me levam às imagens que guardo da minha infância. A minha escola primária, onde votei pela primeira vez aos 18 anos, tinha também uma grande árvore imponente, mesmo à entrada da escola, no pátio frontal. Essa árvore era uma alegoria das quatro estações, e um abrigo nos dias em que esperava que me viessem buscar à escola. Era um mastro. E quis ver nesta árvore, nesta escola, a mesma memória. Porque a fotografava a cada eleição chamava-lhe a árvore da democracia, mas queria imaginar crianças enérgicas a brincar diariamente à sua sombra, e a verem as estações desenhadas nos seus ramos. Talvez seja só esta memória que me tenha deixado tão desapontada com aquele desaparecimento, mas a verdade é que reparei sempre no desaparecimento das árvores de um lugar: se há novas árvores parece que sempre estiveram ali, mas quando são arrancadas de onde sempre estiveram, é como se me arrancassem uma parte do corpo. Um jardim despido, uma clareira recente, uma escola sem árvores.
Se calhar é um passo maior que a perna, mas creio que há espaço para algumas metáforas, das árvores à cidade, da escola à política (da polis). Na cidade onde vivo, tal como no pátio desta escola, têm arrancado muitas árvores e parece que vão arrancar mais (nem mesmo Serralves parece não resistir a esta compulsão construtora). Sim, são necessários serviços, transportes e habitação, mas o grosso desta compulsão por construir mais e destruir áreas verdes na cidade é largamente guiada por políticas que beneficiam apenas um grupo muito restrito de pessoas: investidores privados, unidades hoteleiras, imobiliárias e o mercado turístico da cidade. Se passamos anos a ver casas abandonadas na cidade, hoje essas casas estão a ser esventradas por dentro para fazer unidades de habitação que nunca serão acessíveis ao cidadão comum. A nova linha de metro, concentrada no centro da cidade, é incompreensível (como prioridade), quando as zonas suburbanas da cidade têm actualmente mais acessos por metro que as freguesias da cidade que ficam mais longe do centro (caso da zona ocidental da cidade, com graves falhas de mobilidade). As políticas permissivas do carro são um desincentivo à utilização de meios alternativos de mobilidade, como a bicicleta ou simplesmente andar a pé. As ruas pedonais são diabolizadas pelos comerciantes (ou pelas associações destes) e o estacionamento é escasso e caro. Os transportes, ao fim deste ano e meio, estão novamente cheios e em greves constantes, mas qualquer ideia sobre reduzir o tráfego dentro da cidade é mal visto. As políticas ambientais são nulas e o horror ao verde perpetua-se. Os jardins são modificados e impermeabilizados, com vantagens incertas do ponto de vista ambiental.
Em vez de avançarmos da casa de partida, parece que só recuamos em relação ao que se apresentava como prioritário há pouco mais de dois anos atrás: a emergência climática, a urgência habitacional, um novo paradigma para uma cidade com menos habitantes mas muitos mais visitantes que exigiria uma nova visão de mobilidade.
Enquanto as árvores vão sendo arrancadas para cada monte de cimento que nascerá aí, nesta suposta inevitabilidade de crescimento perpétuo das cidades, tal como a economia, que (alegadamente) definha quando pára de crescer — temos todos um papel acrescido como cidadãos: escrutinar estas ações, fazer perguntas, assinar petições, juntarmo-nos a grupos informais ou coletivos activistas, onde há mais informação e trabalho colaborativo para encontrar soluções. Se nos acomodarmos à ideia de que não podemos nada contra quem “manda”, que somos os Davids destes Golias, estamos a perder mais uma oportunidade de inverter o caminho errante da democracia. Participar é tanto um direito como uma obrigação, e pode passar por muitas formas diferentes, mas deve, sobretudo, deixar-nos alerta e atentos. Para que não acordemos em cidades feitas de betão, com trânsito interminável e sem transportes. Para que possamos replantar todas as árvores, de todas as escolas e jardins, que foram cortadas nesta voragem.
E na vossa cidade, as árvores continuam de pé?
AMBIENTE
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30 setembro 2019
Arte do esmalte
THE ENAMELING CRAFTNuma das muitas visitas que fiz a esta oficina de esmaltagem, conversei com Luís Tato, herdeiro de uma pequena empresa familiar, que começou juntamente com o pai no final dos anos 90. Ao contrário do que era a tendência na época, em que a maioria das fábricas de esmaltagem fechavam portas, eles decidiram abrir e dedicar-se a nichos de mercado que procuravam peças muito específicas e personalizadas.
On one of the many visits I made to this enameling workshop, I spoke with Luís Tato, heir to his family business, which started with his father in the late 1990s. When most enameling factories were shutting down, they decided to open their workshop and pursue a niche market looking for specific and customized items.
On one of the many visits I made to this enameling workshop, I spoke with Luís Tato, heir to his family business, which started with his father in the late 1990s. When most enameling factories were shutting down, they decided to open their workshop and pursue a niche market looking for specific and customized items.
Quando começou a empresa?
WHEN DID THE COMPANY BEGIN?
Foi no final dos anos 80. O sonho começou a nascer por volta dos anos 90. Aquilo ainda foi um bocadinho um embrião… em 1990-91 andamos a ver qual seria a hipótese de uma ideia na qual tivéssemos alguma exclusividade, até que apareceu esta ideia. As fábricas estavam a fechar nessa época, as fábricas de esmaltagem que existiam aqui no Porto e a nível nacional.
It began in the late 1980s. Our "dream" was born around the 1990s. It was still a bit of an embryo. In 1990-1991 we were looking at what could be a good idea on which we had some exclusivity until we finally got it. The enameling factories in Porto and the rest of the country were all shutting down at that time.
It began in the late 1980s. Our "dream" was born around the 1990s. It was still a bit of an embryo. In 1990-1991 we were looking at what could be a good idea on which we had some exclusivity until we finally got it. The enameling factories in Porto and the rest of the country were all shutting down at that time.
Ainda existiam algumas [fábricas]?
WERE THERE STILL SOME [FACTORIES]?
Sim, mais na zona Norte. Ainda apanhamos alguma fábricas a laborar.
Yes, more in the North of Portugal. We still met some factories working.
Yes, more in the North of Portugal. We still met some factories working.
E faziam o quê, essencialmente, que tipo de peças?
WHAT KIND OF PRODUCTS DID THEY MANUFACTURE?
Essas fábricas faziam utensílios de cozinha, banheiras, sinais de trânsito, números das portas, placas das ruas… Tudo o que era ligado à área do esmalte… eles faziam, tudo o que eram utensílios de cozinha, etc. Entretanto, essas fábricas começaram a fechar e vimos que havia ali um mercado que podíamos explorar. Acontece que, foi como já lhe disse, chamavam-nos loucos porque nós estávamos a abrir e os outros a fechar. E nós achámos que devia ficar aqui uma empresa a fazer também.
These factories made kitchen utensils, bathtubs, traffic signs, door numbers, street signs, etc. All the items that relate to the enamel range. All kinds of kitchen utensils, etc. However, these factories began to close up so we noticed that there was a market gap there that we could use. It turns out that, as I've told you, they called us crazy because we were opening up when all the others were closing. We thought that [at least] one company should remain in this area.
These factories made kitchen utensils, bathtubs, traffic signs, door numbers, street signs, etc. All the items that relate to the enamel range. All kinds of kitchen utensils, etc. However, these factories began to close up so we noticed that there was a market gap there that we could use. It turns out that, as I've told you, they called us crazy because we were opening up when all the others were closing. We thought that [at least] one company should remain in this area.
Já tinham conhecimento nessa área?
DID YOU ALREADY HAVE KNOW-HOW IN THIS AREA?
O meu pai é que tinha o know-how praticamente todo. Ele esteve à frente de algumas fábricas de esmaltagem e tinha muito know-how. Eu simplesmente aprendi o que ele me ensinou e depois tentei valorizar a arte do esmalte, que hoje já está mais valorizada, felizmente, graças também à existência da nossa empresa. Começamos então a explorar este sector e começamos por trabalho mesmo muito artesanal, ou seja, muito primitivo ainda, sem computadores, sem informática, sem internet — não existia a internet — nada, ou seja, …através de escantilhões, cartões... fazer os números com escantilhões de alumínio, escantilhões de cartão, plástico… era uma processo muito rudimentar. E portanto, aos poucos, fomos começando a tentar melhorar a qualidade. Com o passar do tempo, começamos a apostar um bocadinho na informática, programas de desenho, entretanto apareceu a internet, que foi uma grande ajuda, porque antes as nossas bases de dados eram as páginas amarelas (risos). E cheguei a ter páginas amarelas de norte a sul, que era o nosso índice, ou seja, íamos ao índice e tinha: “casas de ferragens, casas de carimbos, casas de velharias, pet-shop’s… esses foram os primeiros clientes. Aliás, foi da área de Lisboa que vieram os primeiros clientes. Porque, apesar das fábricas serem no norte, Lisboa é que consumia mais esmalte. Começamos a fazer umas amostras, e tal, e a reacção do público era muito boa, os clientes adoravam saber que havia uma empresa do norte que ia começar com essa atividade e começaram-nos a pedir coisas diversas: os números de porta eram a base, era o número um. Depois eram as placas “dos cães” e o “Aqui há gato” (risos).
My father had practically all the know-how. He was in charge of some enameling factories and had a lot of know-how. I just learned what he taught me, and then I tried to value the craft of enamel. This craft is further appreciated, fortunately, also thanks to the existence of our company. Then, we started to explore the area beginning by making very artisanal work, that is, very rough work, with no computers, no internet — there was no internet [at the time] — nothing, that is, we used templates, cardboard or aluminum templates... making the numbers with aluminum, cardboard, plastic templates… it was a very rudimentary process. And then, little by little, we started trying to improve the quality. As time went by, we began investing a bit more in information technology, drawing software... Then the internet appeared, which was of great help because, before that, our database was the Yellow Pages (laughs). I even had the Yellow Pages from the north to south of Portugal, which we used as our index. I mean, we went to the index and read: hardware shops, stamp shops, junk shops, pet shops, these were our first customers. Our very first customers came mostly from the Lisbon area. Despite most of the factories being in the north of Portugal, Lisbon consumed the most enamel items. We started by doing some samples and the reaction from the public was very good: customers loved to know that there was a company in the north that was going to start this activity. So customers started asking us for different things, door numbers were the basic, was our number one product. Then there were the "dog" signs and "there's the cat" signs (laughs).
My father had practically all the know-how. He was in charge of some enameling factories and had a lot of know-how. I just learned what he taught me, and then I tried to value the craft of enamel. This craft is further appreciated, fortunately, also thanks to the existence of our company. Then, we started to explore the area beginning by making very artisanal work, that is, very rough work, with no computers, no internet — there was no internet [at the time] — nothing, that is, we used templates, cardboard or aluminum templates... making the numbers with aluminum, cardboard, plastic templates… it was a very rudimentary process. And then, little by little, we started trying to improve the quality. As time went by, we began investing a bit more in information technology, drawing software... Then the internet appeared, which was of great help because, before that, our database was the Yellow Pages (laughs). I even had the Yellow Pages from the north to south of Portugal, which we used as our index. I mean, we went to the index and read: hardware shops, stamp shops, junk shops, pet shops, these were our first customers. Our very first customers came mostly from the Lisbon area. Despite most of the factories being in the north of Portugal, Lisbon consumed the most enamel items. We started by doing some samples and the reaction from the public was very good: customers loved to know that there was a company in the north that was going to start this activity. So customers started asking us for different things, door numbers were the basic, was our number one product. Then there were the "dog" signs and "there's the cat" signs (laughs).
Os famosos!
Exatamente. E claro, nós nunca tínhamos feito nada disso, os cliente começaram a mandar-nos uma amostras antigas e a partir das amostras antigas começamos a fazer réplicas. E pronto, começamos a aumentar a nossa capacidade de produção em termos de podermos fazer outros modelos, etc. E, ao longo desse tempo, fomos aos poucos evoluindo, evoluindo… até que, de facto entra a era da informática que nos facilitou muito, embora, há muito trabalho aqui que tem de ser artesanal. Tem que ser um trabalho tradicional, feito manualmente, porque a informática não faz tudo, e por um lado, ainda bem. Por isso muita coisa tem de ser manual… e começamos a fazer tudo à base de placas, o nosso mercado numero um é de produção de placas. E depois de estabilizar a parte das placas, então, começaram a aparecer naturalmente outras áreas, desde os candeeiros, a personalização de louça esmaltada, inclusivé também já fazemos alguma coisa de loiça [própria] esmaltada, e de restauros também de outras peças: mostradores de relógios antigos, que é uma área bastante procurada porque há muita dificuldade nessa área, e aos poucos fomos aperfeiçoando cada vez mais essa produção. Felizmente, chegamos agora a uma altura já com uma qualidade considerável e até mesmo internacionalmente somos reconhecidos. Trabalhamos com muitos país: toda a zona nórdica, Austrália, Estados Unidas e a Europa. Mas cada vez mais para os Estado Unidos e cada vez mais para a Espanha, por exemplo. Tudo, tudo por encomenda e personalizado. Ainda ontem esteve aqui, por exemplo, uns clientes que querem fazer uns candeeiros para pôr por cima de uma mesa de bilhar, que são uns candeeiros que levam três campânulas destas, que leva depois um suporte de um metro e vinte, mais ou menos, por acaso está giro. Ou seja, são coisas que não se vê no mercado…
Exactly. And of course, we had never done any of this before, customers started sending us old samples and from these old samples, we made replicas. And that's it, we started to increase our production capacity in terms of being able to make other models, etc. And, over that time, we were gradually evolving, evolving… until the computer age entered, which made it much easier, although there is a lot of work here that has to be handcrafted. It had to be a traditional craft, handmade, because information technology doesn't do everything, thankfully. So a lot of things have to be handmade. So we started to make everything based on plates and signs, which is our number one product. And after stabilizing this product, others began to come up like the lampshades and the customized enamel crockery. And we also produce our own enameled crockery. We can also restore other pieces: backgrounds for antique wall clocks, which is a popular item because there aren't many options for this piece, and little by little we improved our offer. Fortunately, we have now reached a considerable status with quality and international recognition. We work with many countries: the Scandinavian countries, Australia, the United States, and Europe. But more and more for the United States and more and more for Spain, for example. Everything, everything is made to order and customized. Yesterday, for example, I had some customers here who wanted to purchase some lampshades to put on top of a pool table, which is a piece that includes three of these plate lampshades plus a structure about four feet long, more or less... Well, it worked fine. I mean, these are the kind of things that you simply don't see on the market...
Exactly. And of course, we had never done any of this before, customers started sending us old samples and from these old samples, we made replicas. And that's it, we started to increase our production capacity in terms of being able to make other models, etc. And, over that time, we were gradually evolving, evolving… until the computer age entered, which made it much easier, although there is a lot of work here that has to be handcrafted. It had to be a traditional craft, handmade, because information technology doesn't do everything, thankfully. So a lot of things have to be handmade. So we started to make everything based on plates and signs, which is our number one product. And after stabilizing this product, others began to come up like the lampshades and the customized enamel crockery. And we also produce our own enameled crockery. We can also restore other pieces: backgrounds for antique wall clocks, which is a popular item because there aren't many options for this piece, and little by little we improved our offer. Fortunately, we have now reached a considerable status with quality and international recognition. We work with many countries: the Scandinavian countries, Australia, the United States, and Europe. But more and more for the United States and more and more for Spain, for example. Everything, everything is made to order and customized. Yesterday, for example, I had some customers here who wanted to purchase some lampshades to put on top of a pool table, which is a piece that includes three of these plate lampshades plus a structure about four feet long, more or less... Well, it worked fine. I mean, these are the kind of things that you simply don't see on the market...
Exato, são [peças] mais difíceis de encontrar…
CERTAINLY YOU WERE LEARNING SOMETHING.
… e que nós tentamos fazer personalizado, o que o cliente quer. E portanto, atualmente, somos o único atelier da Peninsula Ibérica a fazer este tipo de trabalho e o nosso objetivo é tentar cada vez mais melhorar a qualidade e ter novos produtos… Uma coisa que me fascina são as peças antigas, se eu puder fazer uma réplica de peças antigas eu faço. Neste momento vamos recuperando algumas, é o caso dos bidés antigos, jarros, bacias, etc. ainda vamos fazendo alguma coisa para manter aquela tradição, aqueles modelos antigos, para não deixar morrer essa arte. Mas essencialmente, a área número um é mesmo [as] placas esmaltadas, no entanto vamos acompanhando com a produção de outra peças, que também é muito bom. Portanto, isto é uma empresa familiar e eu sou a segunda geração (risos).
… and that we try to make custom pieces, exactly what the customer wants. And so, currently, we are the only workshop in both Portugal and Spain to do this type of work and our goal is to try more and more to improve the quality and have new products. One thing that excites me is the old enameled items. If I can make a replica of an old piece, I'll do it. At this moment we are restoring some, it is the case of antique bidés, jars, pots, etc. We restore some of these kinds of pieces to maintain that tradition, those antique designs, so the craft won't vanish. Our number one items are the enamel signs, but we like to follow along with the making of other items, and that's great. So, this is a small family company and I'm the second generation [laughs].
… and that we try to make custom pieces, exactly what the customer wants. And so, currently, we are the only workshop in both Portugal and Spain to do this type of work and our goal is to try more and more to improve the quality and have new products. One thing that excites me is the old enameled items. If I can make a replica of an old piece, I'll do it. At this moment we are restoring some, it is the case of antique bidés, jars, pots, etc. We restore some of these kinds of pieces to maintain that tradition, those antique designs, so the craft won't vanish. Our number one items are the enamel signs, but we like to follow along with the making of other items, and that's great. So, this is a small family company and I'm the second generation [laughs].
Ainda está no início…
YOU'RE STILL IN THE BEGINNING...
É. E tudo devo ao meu pai, porque se não fosse o meu pai isto não existia. Ele é que tinha o know-how, eu simplesmente valorizei e aprendi aquilo que ele me ensinou. Foi óptimo, tudo lhe devo a ele, e pronto, aproveitei ao máximo o que pude aproveitar enquanto ele foi vivo e pronto, tentei aproveitar ao máximo tudo o que ele sabia e que um dia me poderia faltar, …e falta agora, portanto, o que aprendi aprendi, o que não aprendi não aprendi… e tenho uma equipa muito boa também. Felizmente tenho uma equipa que me apoia e que também são profissionais, gostam daquilo que fazem o que é muito bom. E portanto, não é fácil arranjar pessoas para trabalhar nesta área. Não há nenhuma formação profissional nesta área, a única formação profissional é aqui, não há universidades, não há nada… Portanto, temos que dar a formação, temos que começar do zero, mas, ao fim de um ano já está operacional para fazer muita coisa. Temos aqui um funcionário que tem um ano [de casa] e já trabalha muito bem, mas também é preciso gostar. Se não gostar não há nada feito.
Yes, and I owe it all to my father because without him there would be no company. He taught me everything I know, he had all the know-how and I just learned and treasured his teachings. And it was great, I owe it all to him, I took the most of that learning that I could, while he was alive. I tried to value all he knew and that one day I would miss, that I do know... So, what I've learned I've learned, and what I haven't I just won't have the opportunity again. I also have a great team working with me. They're very professional, they like what they do and they support me a lot. Because it's not easy to find people to work int his area. There's no professional training in enamel craft, no university studies, nothing... the only professional training is here. So, I have to train a worker from scratch, but, after a year or so, he/she'll be able to make a lot of tasks. At the moment we have a worker that's working here for a year now, and he's working very well. But you need to enjoy the work, of course. If you don't enjoy it, it won't work.
Yes, and I owe it all to my father because without him there would be no company. He taught me everything I know, he had all the know-how and I just learned and treasured his teachings. And it was great, I owe it all to him, I took the most of that learning that I could, while he was alive. I tried to value all he knew and that one day I would miss, that I do know... So, what I've learned I've learned, and what I haven't I just won't have the opportunity again. I also have a great team working with me. They're very professional, they like what they do and they support me a lot. Because it's not easy to find people to work int his area. There's no professional training in enamel craft, no university studies, nothing... the only professional training is here. So, I have to train a worker from scratch, but, after a year or so, he/she'll be able to make a lot of tasks. At the moment we have a worker that's working here for a year now, and he's working very well. But you need to enjoy the work, of course. If you don't enjoy it, it won't work.